MEU JOVEM LEITOR
Tenho certeza de que naquela noite ele foi dormir feliz! E eu também...
Como ele se chamava? Alex? Alan? Não sei, não prestei muita atenção nesse detalhe, mas sei que ele me disse, só não prestei atenção... O que me chamou mesmo atenção naquele rapaz foi outro detalhe: o brilho de seu olhar!
Ele devia ter entre 20 e 25 anos, moreno, magro e mal vestido. Morava embaixo de uma árvore ao lado do meu antigo escritório. Passava o dia vigiando carros. A noite ele passava dormindo sobre um papelão, embrulhado em um lençol rasgado; ou bebendo com outros dois garotos, que moravam sob a mesma árvore e que levavam a mesma vida ou a mesma sobre- vida.
Na verdade nunca lhe dei muita atenção, eu era “cliente” de um dos outros dois, seus companheiros de desencanto, às vezes lhe dava um trocado, mas nunca sequer olhei direito para ele... Até o dia em que tivemos que mudar de endereço e estávamos precisando de alguém para nos ajudar a carregar os móveis até o carro. Ele se ofereceu para fazer esse serviço extra por um dinheirinho extra. Aceitamos a oferta e pedimos que carregasse as caixas com os livros, pastas e outros objetos, além de mesas, cadeiras e armários.
Ele começou a fazer a tarefa calado, descia e subia as escadas silenciosamente com todo o cuidado para não bater nas paredes e assim quebrar os moveis ou rasgar as pesadas caixas...
Já no final da mudança foi-lhe solicitado que carregasse um pacote com alguns livros de minha autoria. Como o pacote já tivesse sido aberto, ele viu aquela quantidade de exemplares do mesmo livro. Perguntou se podia ver um, meu sócio permitiu e ele olhou apaixonadamente para o livro e perguntou se podíamos dar a ele um daqueles livros. Meu sócio sorriu e disse:
_ Peça a ela, esses livros são dela. Ela que escreveu.
Ele olhou pra mim como se me visse pela primeira vez. E perguntou:
_ A senhora que escreveu esse livro, foi?
Fiz que sim com a cabeça e ele pediu:
_ Se não for muito caro, a senhora podia dar um para mim?
Eu perguntei
_ E você gosta de ler?
Na verdade eu queria perguntar: _ E você sabe ler?
Ele me olhou, os olhos brilhando tanto, de um brilho intenso, e desatou a falar, como se tivesse lido o meu secreto pensamento:
_ Eu sei ler, eu adoro ler! Já terminei até o Ensino Médio! Só não compro livros porque não tenho dinheiro e livro é muito caro, mas outro dia eu vi um escritor que tava vendendo bem baratinho os livros dele e eu comprei um. Ele disse que uma pessoa gasta muito para publicar um livro, é verdade eu sei, mas eu adoro ler. A senhora me dar um? Pode me dar?
Eu falei que sim, claro.
E fiquei olhando a cara de felicidade que ele fez ao receber e folhear o livro. Pensando no que teria levado aquele jovem a estar naquele tipo de vida. Mas pensando também que são esse tipo de pessoas e esse tipo de reação que me motiva a escrever. Eu escrevo pelo prazer de escrever e gosto quando encontro pessoas que lêem pelo prazer de ler. O prazer de todo esscritor é encontrar alguém que leia seus escritos...
Aquele jovem, Alan, Alex, sei lá, me deu uma motivação maior. Sabemos que no Brasil as pessoas não valorizam muito a leitura, não gastam com livros, mas quando encontramos pessoas como, ele percebemos que nem tudo está perdido. Que ainda há esperanças de que a juventude queira ingressar pelos portões da leitura e que possam viver aventuras sem sair do lugar.
Nunca mais o vi, mas tenho certeza de que naquela noite ele foi dormir feliz! E eu também...
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