CRÔNICAS PARA A MINHA MÃE
UM ANO SEM MINHA MÃE
O tempo não passou mãe. Ficou enganchado em alguns arbustos do meu ser ainda em adaptação, nas veredas profundas de minha alma que atônita tenta sobreviver às intempéries de sua falta.
Vivo no paradoxo de uma cronologia absurda onde o tempo aviva a cada segunda a sua presença conciliadora. Planta sem raiz sigo, numa terrível e devastadora estiagem que de mim tomou posse.
Ah, se os dias passados pudessem voltar na sua plenitude! Eu lhe diria o que de engasgado em minha garganta está. Tantas vezes tive a chance de dizê-lo, mas à luz de um bobo orgulho, minhas palavras se esconderam por entre os labirintos da covardia ou talvez desconhecimento de quão grande fosse à minha vida.
Hoje, sob a sombra constante do seu olhar imaginário, nas noites febris à sua inútil procura, perco-me nos devaneios e ilações absurdas a perguntar: mãe, porque me deixastes crescer, por que fostes morar tão distante... mãe, por que a senhora partiu e nunca mais voltou?
PRIMEIRO DIA DAS MÃES SEM A SENHORA, MAMÃE
Primeiro dia das mães sem a senhora, mamãe. Duro... Massacrante e insensato destino que nos separou quando tinha o que de melhor pra lhe mostrar, a sua bisnetinha Alice. A senhora partiu sem vê-la, sem dar a sua benção (ato tão importante pra senhora), sem pegá-la com suas mãos seguras e certamente beijá-la com a sua maneira própria de querer bem.
A senhora partiu numa viagem onde o seu passaporte foi um calvário, gólgota de dor interminável e subumano, onde os reflexos se estenderam até o íntimo do meu ser e de certa forma, puniram-me com profunda dor no peito.
Sua alma passeia horas a fio no lar tão pouco desfrutado. Seu jardim, já sem viço onde as plantas perdem paulatinamente a sua cor, ressentem-se de sua presença. A sala de jantar onde fazia suas refeições, vazia se encontra: sem ceia e ansiosa por vê-la numa impossível volta. Os cômodos onde cuidadosamente caminhava, vive uma insônia crônica desde sua partida.
O seu olhar na despedida, o sorriso triste com a tênue esperança da volta ficou estampado em fotografia gigantesca em minha mente que não a esquece.
Que vazio mãe!!! Dor inexplicável que desafia a inexorável cronologia fria dos tempos que hão de vir, dessa manhã que teima em nascer sem o brilho integral do sol, sem o cheiro do orvalho depois de uma noite de suave sereno. Sem o avermelhado do sol a se pôr todas as tardes e por fim, sem a expectativa do seu abraço e sua voz frágil a dizer:
Deus te abençoe, meu filho.
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