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  13:55

Prefeito de Campo Maior (PI) revoga lei e acaba com parque ambiental das garças

 

O prefeito de Campo Maior, João Félix de Andrade, revogou a lei Nº 012/2019, de 05 de dezembro de 2019, que criava o Parque Ambiental das Garças, as margens da rodovia BR-343 no perímetro urbano da cidade. Na prática, João Félix conclui um marco triste da desconexão entre políticas públicas e sustentabilidade e abre uma visão míope do desenvolvimento urbano, do desprezo flagrante pelo equilíbrio ecológico, e contra o próprio potencial turístico do município.

O local fica as margens da rodovia BR-343, ao lado da Lagoinha do Mucuripe, que é, ne verdade, uma extensão do Açude Grande, outros dos cartões portais da cidade. O local vinha se destacado há anos, tanto em estudos científicos sobre o meio ambiente, o ciclo de reprodução das aves; quanto em programas de televisão e, principalmente, como cartão postal do município, por ser um berçário onde vários tipos de garças se reproduziam em determinado período do ano, algo incomum em um centro urbano.

Crimes ambientais e negligências das autoridades

Uma série de crimes ambientais, como desmatamento, incêndios propositais e, por último, a ação do poder público municipal, acabou com santuários de reprodução das aves que começaria justamente a partir deste mês de dezembro. 

Ainda era ano de 2012 quando o Em Foco acompanhou um flagrante da polícia ambiental e polícia civil contra um homem desmatando o local. Ele se dizia pago pelo proprietário. Não se sabe em que deu a investigação.

Ali começava também uma sequencia de fogos planejados de forma criminosa. Todo período de estiagem, em todos os anos, era certeza que seria toca de fogo. Também nunca foi preso ou condenado ninguém.

Em novembro de 2021, já na gestão do atual prefeito João Felix, o proprietário do terreno, que não se sabe ao certo quem seja, pediu e a prefeitura autorizou uma "limpeza geral" no terreno. Arvores foram derrubadas por tratores e tudo feito entulhos.

Na época, o Em Foco conversou com o, então, secretário de Meio Ambiente da prefeitura, o ex-prefeito Marco Bona, e ele confirmou a autorização e disse que ela se deu “após laudo de vistória, feito depois de um incêndio ocorrido na área, em que foi constatada destruição da vegetação sem possibilidade de recuperação” o que sabemos que não é verdade.

Ambientalistas vão provocar o ministério publico mais uma vez 

O professor e ambientalista Ernanes Leite disse ao Em Foco que não teve acesso ao documento de criação da lei, mas que já fez bastantes denúncias na tentativa de evitar a destruição do local.

“Infelizmente Campo Maior vive um período obscuro na área ambiental. Isso é lamentável. Aquela área que margeia a Lagoa do Açude tem uma importância muito grande, pois abriga uma grande variedade de aves aquáticas. Todas as aves estão ameaçadas de serem extintas devido a falta de abrigo para reprodução” disse.

O ambientalista Dionísio Carvalho afirmou que existem interesses econômicos na área.

“A Câmara Municipal de Campo Maior tem que se movimentar, os vereadores tem que movimentar a favor da natureza, a favor do meio ambiente, já foi uma grande conquista essa área, a prefeitura nunca fez nada, aquilo é um atrativo turístico, tem uma importância ambiental significativa, pois não só as garças vivem ali, então a preceitua faz um retrocesso desse. Vamos acionar o Ministério Público Estadual e vamos pedir ações enérgicas. O que estão fazendo isso é para favorecer a especulação imobiliária e é um retrocesso”, criticou.

O ambientalista Dioniso Carvalho disse ao Em Foco que a ação do prefeito João Félix é um retrocesso ambiental e vai na contramão de tudo que se faz em outros locais do mundo que é a expansão das áreas verde. 

“Era um cartão postal de Campo Maior. Deveriam ser recuperadas as áreas degradas. Já haviam destruído as arvores e agora revogar a lei?” questiona.

Segundo ele, a Câmara de vereadores não pode ser cumplice disso e precisa se manifestar.

“Vamos entrar com ação do Ministério Público. O período que estamos passando já é muito preocupante e o berço das garças virar berço da destruição não será permitido. A população também precisa se manifestar” concluiu.

Em 2022 o Promotor de Justiça Mauricio de Sousa abriu um Procedimento Administrativo para que a prefeitura providenciasse a desapropriação da área, cerca de 1 hectares, para efetivar a lei de criação do Parque ambiental, previsto na lei Nº 012/2019. Como se ver, a prefeitura nem cumpriu a recomendação do MP e ainda derrubou a lei.

Local seria construído um grande supermercado 

Comentários nos bastidores é que o prefeito João Felix revogou a lei para autorizar uma construção imobiliária no local, que seria a instalação de uma grande rede de supermercado.

A reportagem tentou contato com a Secretaria de Meio Ambiente de Campo Maior, e  o secretário de Meio Ambiente, ex-prefeito Marco Bona, disse que a Lei que criou o Parque descumpriu legislação federal (Lei N° 9.985/2000) que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

Questionado se o município vai criar outra lei para o mesmo espaço, cumprindo as diretrizes legais, o secretário respondeu que não há previsão. Visto que a garça não está em extinção e se trata de ave migratória.

Campo Maior é exemplo zero de Selo Ecológico

O município de Campo Maior tem acumulado prêmios sobre supostos avanços ecológicos, inclusive com o ICMS ecológicos, que abarrotou os cofres públicos de dinheiro. Mas a decisão de exterminar de vez o berçário de desova e recriação de aves, o Parque das Garças, é um chute no estomago da biodiversidade, do espaço convivência de aves, de área verde; local de refúgio para aves nativas que ainda vivem no perímetro urbano, as margens do Açude Grande, além de ser ponto de visitação, de pesquisa, um verdadeiro laboratório vivo para a educação ambiental. Ao ignorar o valor ecológico e social de berçário das garças, o prefeito demonstra uma visão limitada sobre o que realmente significa progresso.

O desmonte do espaço, seja para construção de um empreendimento comercial, gerar emprego e renda, seja para casas residenciais, revela prioridades distorcidas, pois tudo pode ser feito em outros espaços, expandindo as fronteiras da cidade. Investir em infraestrutura sustentável e preservar áreas verdes é uma necessidade em tempos de crise climática. 

Mais uma vez, parece que vamos ao velho ditado, que já se perpetua, do “Campo Maior já teve”. Berçário das garças parece que acabou. O próximo passo é aterrar a própria lagoa Mucuripe?

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