A 2ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por unanimidade, nesta terça-feira (27) abrir ação penal contra a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o marido dela, o ex-ministro do Planejamento Paulo Bernardo, por suspeitas de terem recebido de forma ilegal R$ 1 milhão para a campanha de Gleisi ao Senado em 2010. Dessa forma, eles se tornaram réus na ação.
Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República, o dinheiro teria origem no esquema do chamado petrolão, investigado pela Operação Lava Jato, e teria sido repassado à campanha com o objetivo de manter no cargo o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, hoje um dos principais delatores do esquema de corrupção na estatal.
A decisão veio após voto do relator do processo, ministro Teori Zavascki, responsável pelas ações da Operação Lava Jato no Supremo. Participaram do julgamento, além de Zavascki, Celso de Mello, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Em seu voto, Teori rejeitou o argumento dos advogados de defesa de que a denúncia não traria provas das acusações. "Não há como acolher a tese das defesas de que denúncia seria inepta por não descrever o fato criminoso em todas as suas circunstâncias", disse. "Para embasar a peça acusatória, apresenta o Ministério Público inúmeros indícios concretos", afirmou Teori.
O ministro também comentou as contradições nos depoimentos iniciais dos delatores Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, sobre a quem Paulo Bernardo teria feito a suposta solicitação do dinheiro, tese da defesa. Segundo Teori, apesar da divergência inicial, posteriormente ambos confirmaram o repasse feito a pedido do ex-ministro. "Youssef não só confirmou a relação da entrega de valores, reconhecendo ainda, mediante fotografia, a pessoa do denunciado Ernesto Rodrigues como a pessoa responsável por receber a quantia", disse Teori.
Ao abrir processo, o STF transforma Gleisi e Paulo Bernardo em réus pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A decisão, no entanto, não equivale a uma confirmação da suposta participação do casal no esquema, o que deve ser provado durante a fase de julgamento da ação, que começa agora.
A senadora e o marido negam qualquer participação em irregularidades. Os advogados de defesa do casal afirmam que a denúncia não traz provas e se baseia em "meras conjecturas". Bernardo foi ministro do Planejamento no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministro das Comunicações na gestão da ex-presidente Dilma Rousseff. Também foi denunciado, e transformado em réu, o empresário Ernesto Kugler Rodrigues, acusado de atuar como intermediário no repasse do dinheiro à campanha petista.
O advogado de Rodrigues, José Carlos Cal Garcia Filho, afirmou, em manifestação durante sessão da 2ª Turma, que não há provas de que seu cliente teria praticado atos ilícitos. "A denúncia não traça uma linha no sentido de dizer que Ernesto Rodrigues interferiu no recebimento de propina no âmbito da Petrobras", afirmou Garcia Filho.
O que diz a denúncia
Segundo afirma a Procuradoria, Paulo Bernardo teria pedido o valor à Paulo Roberto Costa e os pagamentos foram realizados por meio de empresas de fachada em operação que contou com a participação do doleiro Alberto Youssef, também delator na Lava Jato.
O suposto pagamento de propina à campanha de Gleisi Hoffmann foi detalhado por Paulo Roberto e Youssef em seus acordos de colaboração premiada com a Lava Jato, segundo afirma a Procuradoria.
A denúncia afirma que o advogado e delator Antonio Carlos Pieruccini, que possuía negócios com Youssef, foi o responsável por transportar os valores, em dinheiro, de São Paulo a Curitiba. A entrega teria sido feita a Ernesto Rodrigues em quatro parcelas de R$ 250 mil, segundo a Procuradoria
O que diz a defesa
Em defesa prévia apresentada ao STF, os advogados de Gleisi e Paulo Bernardo afirmam que não há provas de que eles de fato teriam recebido os repasses e que a denúncia se baseia em depoimentos contraditórios dos delatores, que teriam mudado sua versão dos fatos mais de uma vez sobre se o pedido de dinheiro partiu ou não de Paulo Bernardo.
Entre os pontos apresentados pela defesa, também está a alegação de que as quebras de sigilo telefônico das investigações encontraram apenas um telefonema entre Pieruccini, que teria entregue o dinheiro, e Rodrigues, que teria recebido os repasses, apesar de a denúncia afirmar que eles se encontraram ao menos quatro vezes.
"A presente denúncia possui diversos excertos em que hipotéticas conjunturas são utilizadas pela PGR para tentar viabilizar a persecução penal", escrevem os advogados na defesa apresentada ao STF.
Crítica às contradições
O ministro Gilmar Mendes criticou as contradições apontadas entre as delações de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef e afirmou que o caso deverá ser analisado com mais cuidado durante a fase de julgamento do processo.
"Esses ajustes que vão sendo feito nas delações, sem dúvida nenhuma dão azo [motivo] de preocupação. E certamente isso merecerá análise muito mais aprofundada quando do julgamento de mérito [da denúncia]", disse Mendes.
Os advogados de defesa Rodrigo Mudrovitsch e Verônica Sterman apontaram, durante a sessão, que Paulo Roberto negou ter tratado de repasses de campanha com Paulo Bernardo e afirmou que a solicitação de dinheiro lhe foi encaminhada por Youssef.
Por sua vez, o doleiro disse em seu depoimento que não conhece Paulo Bernardo e que o pedido de repasse para o petista teria sido feito a ele pelo ex-diretor da Petrobras.
"Paulo Roberto Costa afirma que conhece Paulo Bernardo mas que nunca tratou com ele de valores ilícitos, e indica quem que teria solicitado o repasse seria Alberto Youssef. De outro lado, Youssef disse que sequer conhece Paulo Bernardo e que quem teria lhe passado essa solicitação seria Paulo Roberto Costa", disse Sterman.
"Se Paulo Bernardo não falou nem com um nem com outro, como pode a Procuradoria-Geral da República tê-lo denunciado por essa suposta solicitação", perguntou a advogada.
Ex-ministro é alvo de outra investigação
Paulo Bernardo também é investigado pela Operação Custo Brasil, que apura a participação do ex-ministro num esquema que teria desviado R$ 102 milhões para o pagamento de propina a agentes públicos e ao PT.
O esquema funcionaria por meio da contratação pelo Ministério do Planejamento da Consist, empresa de software que administrava empréstimos consignados de milhões de servidores. A advogada Verônica Sterman, que defende Paulo Bernardo neste caso, afirma que o ex-ministro não recebeu propinas.
Em agosto, o juiz federal Paulo Bueno de Azevedo, da 6ª Vara Federal Criminal em São Paulo, aceitou a denúncia do Ministério Público Federal na Custo Brasil e tornou réus Paulo Bernardo e mais 12 investigados por suspeitas de terem praticados os crimes de organização criminosa, corrupção e lavagem de dinheiro.
A decisão de hoje do STF não tem relação com as investigações da Custo Brasil.
Fonte: UOL
Por Helder Felipe
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